Ontem
de manhã, quando eu li a manchete "Assaltantes matam menino boliviano"
e, na linha fina, algo como "Brayan, de 5 anos, chorava desesperado no
colo da mãe", fiquei atônito por vários minutos. É impossível pra
qualquer pessoa que conheça a inocência de uma criança se distanciar de
um fato assim. Enquanto lia aquela construção linear e fria do
acontecimento, pensava na confusão na cabeça do menino, vendo seus pais desesperados e sob a mira daquele cano preto, talvez até desconhecido pelo garoto.
Eu não tinha a mínima conjetura sobre a ação dos bandidos. Não passava
pela minha cabeça uma justificativa para aquele desfecho - não que haja
explicação cabível, mas eu buscava algo. Era uma criança que, indefesa,
chorava. Crianças choram quando se sentem ameaçadas. Caralho, o mundo
todo sabe disso!
Passou pela minha cabeça logo em seguida o
caso de outro menino, João Hélio, que morreu em circunstâncias que não
carecem de ser lembradas, afinal reforçam o estigma. Lembrei também, não
sei por que, de um crime épico: o assassinato da família Clutter (pai,
mãe e dois filhos), fato-protagonista da obra-prima de Capote, "A Sangue
Frio".
Mas seja pela atualidade do ocorrido, ou pelo nível
trágico, ainda matutei por alguns instantes, até que parei e olhei bem
para aquela descrição: "menino boliviano". Boliviano. Doeu um pouco mais
onde quer que estivesse doendo.
Brayan, boliviano. Da mesma
nacionalidade daqueles ambulantes que trabalham sem registro vendendo
quinquilharias nas praças de São Paulo? Ou que tocam por horas com suas
antaras e charangos, também à margem? Ou, pior, que agonizam em regime
de escravidão no Brás, no Bom Retiro?
Sim, Brayan nasceu no
mesmo país que eles. Brayan veio ao Brasil assim como eles,
provavelmente incluído por tabela no desejo dos seus pais de buscar uma
vida melhor aqui, nos EUA da América do Sul. Brayan - assim como os
ambulantes, os músicos e os escravos das confecções - sempre foi
ignorado por nós. Até ontem.
Ah, mas estou sendo
circunstancial, pensei. O que tem a ver? Talvez nada, talvez um pouco ou
quase tudo. "É cultura". Não, não é cultura. É xenofobia.
Quanto ao crime, que investiguem minimamente. Que interroguem o grupo e
perguntem, por favor, se o sr. responsável pelo disparo sabe por que a
criança chorava.
Foto que tirei de uma banda familiar boliviana se apresentando em
frente ao Parque Trianon, em julho de 2012, na Avenida Paulista.
O pequeno flautista era muito bom.
29 de junho de 2013
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