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29 de junho de 2013

Brayan, uma parte do todo

Ontem de manhã, quando eu li a manchete "Assaltantes matam menino boliviano" e, na linha fina, algo como "Brayan, de 5 anos, chorava desesperado no colo da mãe", fiquei atônito por vários minutos. É impossível pra qualquer pessoa que conheça a inocência de uma criança se distanciar de um fato assim. Enquanto lia aquela construção linear e fria do acontecimento, pensava na confusão na cabeça do menino, vendo seus pais desesperados e sob a mira daquele cano preto, talvez até desconhecido pelo garoto.

Eu não tinha a mínima conjetura sobre a ação dos bandidos. Não passava pela minha cabeça uma justificativa para aquele desfecho - não que haja explicação cabível, mas eu buscava algo. Era uma criança que, indefesa, chorava. Crianças choram quando se sentem ameaçadas. Caralho, o mundo todo sabe disso!

Passou pela minha cabeça logo em seguida o caso de outro menino, João Hélio, que morreu em circunstâncias que não carecem de ser lembradas, afinal reforçam o estigma. Lembrei também, não sei por que, de um crime épico: o assassinato da família Clutter (pai, mãe e dois filhos), fato-protagonista da obra-prima de Capote, "A Sangue Frio".

Mas seja pela atualidade do ocorrido, ou pelo nível trágico, ainda matutei por alguns instantes, até que parei e olhei bem para aquela descrição: "menino boliviano". Boliviano. Doeu um pouco mais onde quer que estivesse doendo.

Brayan, boliviano. Da mesma nacionalidade daqueles ambulantes que trabalham sem registro vendendo quinquilharias nas praças de São Paulo? Ou que tocam por horas com suas antaras e charangos, também à margem? Ou, pior, que agonizam em regime de escravidão no Brás, no Bom Retiro?

Sim, Brayan nasceu no mesmo país que eles. Brayan veio ao Brasil assim como eles, provavelmente incluído por tabela no desejo dos seus pais de buscar uma vida melhor aqui, nos EUA da América do Sul. Brayan - assim como os ambulantes, os músicos e os escravos das confecções - sempre foi ignorado por nós. Até ontem.

Ah, mas estou sendo circunstancial, pensei. O que tem a ver? Talvez nada, talvez um pouco ou quase tudo. "É cultura". Não, não é cultura. É xenofobia.

Quanto ao crime, que investiguem minimamente. Que interroguem o grupo e perguntem, por favor, se o sr. responsável pelo disparo sabe por que a criança chorava.


 





















Foto que tirei de uma banda familiar boliviana se apresentando em frente ao Parque Trianon, em julho de 2012, na Avenida Paulista.

O pequeno flautista era muito bom.

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