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15 de setembro de 2014

A recondução da arte a lugares inusitados

Durante muito tempo os espaços aonde a arte se faz presente foram de certa forma delimitados e consagrados por aqueles que se interessam pelo assunto. Em sua maioria os museus, instituições privadas e sem fins lucrativos, acabaram se tornando o ponto de encontro natural de exposições, efêmeras ou mais duradouras, das mais variadas expressões artísticas. Esse cenário, porém, vem sofrendo certa mutação graças ao avanço da arte de rua, exposta em espaços públicos e, mais recentemente, à invasão criativa feita por variados artistas em locais privados, com destaque para o antigo Hospital Matarazzo, em São Paulo e para a Fábrica Bhering, no Rio de Janeiro.

Não se trata de tomadas itinerantes que perpassam vários lugares, dentre os citados acima. São exibições pensadas para esses lugares, cujas limitações físicas e arquitetônicas precisam se encaixar no projeto artístico do local.

Foi assim com o prédio de 1904, na altura do número 190 da Rua Rio Claro, próximo à Avenida Paulista, em São Paulo. Após 20 anos de silêncio, o antigo Hospital Umberto Primo – hoje Cidade Matarazzo – abriu suas portas para a efervescência artística de mais de 100 autores brasileiros e estrangeiros, que se dispuseram voluntariamente ao projeto.

“Há sete anos procuro um lugar como este. Queria um lugar onde todos na cidade pudessem se expressar. Isto que está aqui é um movimento, um processo dinâmico, porque tudo o que você vê aqui vai desaparecer”, detalha Alexandre Allard, idealizador da exposição.

O objetivo integrador do Cidade Matarazzo é fomentado também pelo curador, Marc Pottier. “Temos muitas obras que são como um diálogo com o espaço”, afirma. A tal comunicação se dá de maneira muito óbvia em certos momentos (como nos raios-x de duas colunas cervicais, fazendo clara alusão aos tempos remotos de consultório clínico do Matarazzo) e não tão clara em outros (a frase “Havia mais futuro no passado”, cravada em uma das paredes sujas do local é um convite à reflexão).

Se o Cidade Matarazzo contempla momentaneamente a arte de uma centena de criadores, a Fábrica Bhering, no Rio de Janeiro, é um espaço coletivo transformado definitivamente em point artístico. Há décadas atrás toneladas de chocolate e balas eram produzidas no local. Hoje, o inusitado novo uso que se dá aos cômodos dos seus 16 mil m² parece ter atingido seu ápice criativo e de interação: desde agosto os visitantes podem conferir os 80 ateliês do local todo primeiro sábado do mês, com direito a um café bastante aconchegante.

A Bhering já era conhecida entre os amantes desses espaços por fazer, esporadicamente, eventos abertos ao público. Esses momentos traziam os moradores de morros próximos ao Santo Cristo, local da antiga Fábrica, ao encontro da pintura, da arte plástica, cenografia, moda etc. As comunidades do Pinto e da Providência já são frequentadoras do local, contrariando certa lógica elitista da arte museológica, que por vezes não está acessível financeiramente ao morador do morro – ou não o deixa à vontade para frequentá-la.

A mostra do Cidade Matarazzo, que termina no próximo dia 12 de outubro, não parece ser o ponto final da revitalização. A intenção dos colaboradores é transformar o local num ponto definitivo e alternativo de confluência artística da cidade, assim como caminha para ser a Fábrica Bhering no Rio.

Ver a arte sendo reconduzida para tais espaços pouco convencionais de exposição gera a expectativa de vê-la atingindo cada vez mais quem não está habituado com tais criações – muitas vezes, por motivos que fogem ao simples desinteresse. A popularização da arte, pauta tão cobrada pelos movimentos sociais, pode estar justamente nessa invasão criativa de locais abandonados e que naturalmente são propícios para a montagem, exibição e consagração das mais variadas obras artísticas. 

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Onde? Cidade Matarazzo - al. Rio Claro, 190, Bela Vista, região central
Quando? De 9/9 a 12/10, terça a domingo, das 10h às 17h
Quanto? Gratuito

GALERIA BHERING
Onde? Endereço: Rua Orestes, 28 - Santo Cristo - Telefone: (21) 2223-2477
Quando? Todo primeiro sábado do mês.
Quanto? Gratuito

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